Instituto Pacs participa de seminário em Brasília que discute a importância da Lei Marco de Direitos Humanos e Empresas
Com o objetivo de discutir a importância do Projeto de Lei 572/22, que prevê a criação da Lei Marco de Direitos Humanos e Empresas (atualmente em discussão no Congresso Nacional), foi realizado entre os dias 14 e 16 de março, em Brasília, o seminário Direitos Humanos e Empresas, o Brasil na frente – Lei Marco no caminho global de mais regras para as empresas.
O evento, organizado por Amigos da Terra Brasil, CUT, Fundação Friedrich Ebert, Homa – Centro de Direitos Humanos e Empresas, MAB e Oxfam Brasil, faz parte da campanha Essa Terra Tem Lei – Direitos para os Povos e Obrigações para as Empresas. Durante os três dias de seminário, estiveram presentes parlamentares, pesquisadores de universidade e organizações da sociedade civil, incluindo o Instituto Pacs, representado pela coordenadora Ana Luisa Queiroz.
A mesa de abertura, que teve como tema “Direitos Humanos e Empresas: os desafios na nova etapa do Brasil”, contou com a participação do ministro de Direitos Humanos e Cidadania Silvio Almeida, de Deborah Duprat (jurista e vice-procuradora-geral da República entre 2009 e 2013), Dulce Pereira (CNDH-UFOP), Gonzalo Berrón (FES Brasil) e Leandro Scalabrin (MAB).
De acordo com Silvio Almeida, “a luta do ministério é para que a questão dos direitos humanos e empresas seja uma política do Estado brasileiro, para que possa ser disseminada por toda a atividade econômica e empresarial brasileira”. O ministro pontuou ainda que, no momento, há um esforço coletivo para a criação de um grupo de trabalho com outros ministérios para que se estabeleça a inclusão da política de direitos humanos e empresas junto ao Programa Nacional de Direitos Humanos.
Ainda segundo Almeida, o PL traz a possibilidade de olharmos para as violações de direitos humanos de maneira mais complexa, deixando de lado uma chave que centraliza o Estado como principal agente violador, e permite que visibilizemos o que grandes empresas têm feito nos territórios. Para ele, uma política efetiva de direitos humanos precisa levar em consideração a materialidade das violações, não somente sua dimensão moral.
Para Deborah Duprat, a sociedade brasileira tem se organizado de maneira como se cada indivíduo fosse uma empresa responsável sozinho por seu próprio sucesso. Essa alta penetração da lógica empresarial em nossas vidas faz urgente uma regulação das empresas. O PL se torna uma importante proposta da sociedade frente a um mercado cada vez mais guiado pela competição. Já Leandro Scalabrin ressaltou como o racismo é estrutural no país e como as populações e seus territórios são afetados pela atuação dessas empresas.
Dulce Pereira, que também é professora da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), relembrou durante sua fala o rompimento da barragem da Vale em Mariana e a forma como a empresa agiu após o crime, negando a ruptura, a contaminação e dificultando as negociações das indenizações aos atingidos e atingidas.
Na segunda mesa do dia, que trouxe o debate sobre a necessidade da Lei marco na defesa dos direitos humanos no Brasil, Cláudia Ávila (MTST-RS), Gabriel Bezerra (Contar), Jandyra Uehara (CUT) e Mariana Vidal (Comissão Pastoral da Terra) trouxeram a perspectiva dos movimentos sociais sobre como as violações de direitos humanos são praticadas por empresas de diversos setores no país e como é fundamental que a legislação seja uma garantia, principalmente para os territórios afetados, de que esses crimes não fiquem impunes.
A disparidade das regulamentações socioambientais aplicadas na europa e pelas empresas europeias no Brasil e o uso de mão de obra escrava foram temas tratados como prioridades na mesa. O PL foi trazido como uma ferramenta importante para avançar na responsabilização de empresas, não só sobre a violações socioambientais cometidas a nível territorial, como também às violações de direitos humanos de trabalhadores e trabalhadoras.
Já o segundo dia de seminário, organizado em 3 diferentes mesas, trouxe a apresentação mais aprofundada do PL 572/22, os desafios das normas atuais e da aplicação do PL e o debate sobre direitos humanos e empresas no contexto internacional. Dentre os participantes, estavam a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS), Clara Solon (chefe da Assessoria Especial de Assuntos Internacionais do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania), Manoela Roland (Homa), Antônio Megale (assessor jurídico da CUT), Melisanda Trentin (Justiça Global), Thales Coelho (MPF), Fabiana Severo (DPU), Tchenna Maso (Homa) e Illan Fonseca (MPT), Andressa Soares (Homa), Julia Neiva (Conectas), Letícia Paranhos (Amigos da Terra Brasil), Iván Gonzalez (CSA) e André Campos (Repórter Brasil), .
Para a deputada federal Fernanda Melchionna, é fundamental neste momento a junção de mais aliados na defesa pela luta dos trabalhadores e dos movimentos sociais, além da inclusão de mais direitos no PL: “Precisamos atuar para que ele não seja um marco que defenda apenas os direitos das empresas, colocando seus interesses comerciais acima dos direitos humanos, como ocorre hoje”.
Gustavo Ferroni, assessor da Oxfam Brasil, um dos mediadores do segundo dia de evento, ressaltou que dentro desse contexto, há grandes interesses de empresas nacionais e internacionais em jogo, cujas atuações vão em caminhos opostos da visão da sociedade civil e das populações atingidas. Por isso, é preciso não apenas fortalecer o PL, mas também todas as outras iniciativas em curso no campo do debate dos direitos humanos e empresas.
O último dia de seminário foi marcado por uma Audiência Pública realizada na nova Câmara dos Deputados, promovida pelo deputado federal Helder Salomão (PT-ES), um dos autores do projeto de lei. Na ocasião, também estiveram presentes os deputados federais Pastor Henrique Vieira (PSOL-RJ), Ana Pimentel (PT-MG) e Reginete Bispo (PT-RS).
“Nós precisamos entender a violação de direitos humanos como uma coisa sistêmica e estrutural. Não me parece que seja o sistema funcionando de forma errada. O sistema está funcionando perfeitamente. Uma sociedade capitalista, estruturalmente racista e patriarcal tem a gestão da violência como norma, e a violação como resultado esperado. Não é uma disfuncionalidade do sistema, é o sistema que coloca o lucro acima da dignidade humana”, alertou o Pastor Henrique Vieira, pontuando ainda a importância do PL nesse contexto, já que o projeto traz a centralidade dos direitos humanos, tratando-o como parâmetro prioritário.